Esvaziar a banheira com um copo

A recente portaria 110/2023 de 21 de Abril ameaça dar uma machadada fatal na Aviação Geral portuguesa já de si moribunda. Como sempre o governo português, esse eterno chefe de família bêbado que deixa a família a passar fome em casa e vai para o casino, foi mais papista que o Papa e antecipou-se à União Europeia, nesta preocupação sobretudo mediática e política.

Convido-os a fazerem um pequeno exercício: imaginemos que Portugal tem registados 100 aviões Antonov An-2, com motores radiais de mil cavalos a pingar óleo e a gastar 2 litros e meio de combustível por minuto. Não tenho nada contra os Antonovs, adoro o An-2, mas assim de repente, lembrei-me destes monstros dóceis porque são conhecidos de toda a gente e têm grandes motores. Não, aliás, imaginemos que existem 100 Antonov e 100 Boeing B-52. Daqueles que a descolar emitem jorros de fumo medonhos que dá para cultivar batatas. Esta maravilhosa e hipotética colecção da mais bela poluição do Mundo, não chegaria para se comparar em termos de poluição com apenas um navio de cruzeiro, desses que escala Lisboa, cheios de reformados a comprarem imans para o frigorífico e a atafulhar os elétricos. Não é só o “fumo” equivalente a 700 camiões TIR por hora, nem os 250 gramas de Carbono por passageiro por Km (dados disponíveis online em Carbon Independent.org). Numa semana típica de um maravilhoso cruzeiro, cheio de reformados da periferia a tirarem selfies em frente a uma piscina com mais gente do que um frasco de sal, um destes monstros atira borda fora mais de um milhão de litros de esgoto, 35,000 litros de óleo, e produz 50 toneladas de lixo. Fora o facto de poluição acrescida de que, na maioria dos casos, os passageiros apanharam um avião para embarcarem nesse cruzeiro.

Neste momento em África, continente despojado das mais básicas infraestruturas, encontram-se  em funcionamento mais de 3 milhões e meio de geradores. que se juntam a incontáveis milhões de veículos obsoletos oriundos da Ásia e da Europa, que não satisfazem quaisquer critérios de emissões. A pobreza galopante e endémica do continente africano não permite qualquer margem nem veleidade para pensar na questão ambiental.

Falando em Ásia, essa magnífica powerhouse para onde empurrámos a poluição para debaixo do tapete de modo a justificar a nossa limpidez ambiental, polui só com a indústria da moda, cerca de 20 por cento dos recursos hídricos mundiais. De acordo com o Institudo multi-disciplinar das publicações digitais (MDPI) a moda é a segunda indústria mais poluidora do planeta a seguir à indústria do petróleo, contribuindo entre 5 e 8 por cento para o aquecimento global. Tudo para as serigaitas influencer vestirem uma camisola uma vez e deitarem-na fora como fazem muitas vezes.

Mas se fosse o problema só a Moda. Desde alfinetes a foguetões tudo é feito na Ásia, em indústrias que funcionam com carvão, o maior e mais destacado responsável pelas emissões de Carbono, depois trazidos do outro lado do Mundo, nos maiores navios com os maiores motores Diesel jamais criados pelo Homem. Na Ásia de modo inverso, em vez da pobreza imoral e dolorosa de África, é a embriaguez do lucro das economias emergentes e a necessidade de abastecer o Ocidente, que relegam agora para segundo plano qualquer preocupação ambiental.

Como podemos ver, o problema da poluição no Ocidente, foi empurrado para jusante e para montante. É como nos termos esquecido da torneira da banheira aberta, e agora chegámos a casa e temos uma inundação… em vez de fecharmos a torneira, culpamos os putos e obrigamo-los sob a ameaça de bofetadas, a esvaziar a banheira ainda a transbordar constantemente, com um copo, enquanto empurramos com a vassoura a água escadas abaixo para as casas dos vizinhos. É isto que a Europa esbaforida está a fazer, e sobretudo Portugal, esse fedelho malcriado que bate aos irmãos, mas que perante a Mãe Europa, se faz de santinho, bem-comportado e obediente.

Isto da Taxa de Carbono não é novidade. Desde 2016 que a Organização Internacional da Aviação Civil (ICAO) tinha criado o Programa de redução de carbono para a Aviação Internacional (CORSIA) que, embora rudimentar, embrionário e tenha muita dificuldade em se implantar em muitos países , é um passo importante para a necessidade legítima de conter e menorizar os efeitos da poluição na Atmosfera gerados pela Aviação. A  União Europeia foi ainda mais longe e aplica já essa taxa em todos os voos dentro do território europeu e pensa até em revê-la, mas apenas em 2027. 

O problema não é portanto, a já existente taxa, que por sinal também abrange os nossos amigos reformados a bordo dos navios de cruzeiro. A ignomínia desta taxa é que, olhando para o mapa-múndi, não podemos deixar de sentir que foi criada porque é a maneira mais fácil de mostrar preocupação ambiental.

É mais fácil taxar-me por uma bebida e multar-me se eu não meter a garrafa no ecoponto, do que evitar trazê-la do outro lado do Mundo num porta contentores dentro de um saco de plástico, num caixote de papelão, ao lado das baterias de lítio dos carrinhos elétricos. Além disso turistas, reformados e pessoas que usufruem da aviação, têm rendimentos extra e não fazem manifestações. Pagam impostos e não bufam.

Com o cumulativo imoral desta medida, servir de “vingança social” . A invejinha do portuguezinho socialista é muito diferente da inveja normal. Numa inveja “normal” e saudável, o vizinho vê o meu carro e pensa em comprar um melhor. Na invejinha mediocre portuguesinha pequenininha, se o vizinho não tem um carro, eu também não tenho nada que ter.

Portanto a partir de agora podemo-nos ir deitar com a nossa consciência limpíssima graças a esta taxa, com a torneira da banheira aberta e água a escorrer escadas abaixo nesta Europa cada vez mais irrelevante e impotente na esfera ambiental mundial, sabendo que estamos a “contribuir” com o nosso copinho de água.

O que este excesso de legislação e taxação vai fazer é apenas empurrar as pessoas, operadores e fabricantes para a ilegalidade, para a habitual indústria da corrupção e exportar a pegada ambiental para outras paragens. Mais nada.

Mike Silva. Maio de 2023. Imagens meramente ilustrativas e poderão conter direitos de imagem associados. Imagem Carbon por Chris Leboutillier.

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