Comunicações no Tráfego Aéreo

Mal-entendidos nas Comunicações de Tráfego Aéreo

O livro “Mal-Entendidos nas Comunicações ATC” (Misunderstandings in ATC Communication) foi escrito por um psicólogo, linguista e piloto, Dr.Imanuel Barshi e por Candace Farris, investigadora na Universidade McGill em Montreal.

Este livro analisa de forma abrangente a literatura das comunicações aeronáuticas, reporta um método experimental eficiente de investigação dos aspectos do discurso na aviação e determina recomendações sólidas para a resolução dos problemas de falhas de comunicação. O livro examina combinações complexas de factores, de múltiplas fontes, para identificar quais os que contribuem para essas falhas. As descobertas devem dissipar alguns pressupostos comuns sobre as razões dos mal-entendidos entre controladores de tráfego aéreo e os pilotos.

Esta pesquisa sugere que a taxa de erro nas comunicações pode diminuir bastante ao reduzir-se a dimensão das mesmas e ao consciencializar os indivíduos pilotos ou controladores, nativos em Inglês, que se devem responsabilizar pelo sucesso das comunicações nesse idioma.

O estudo desenvolveu-se com o propósito de se conseguir perceber alguns dos factores que influenciam a quebra nas comunicações ATC.

Os autores descobriram que os erros de “read back “crescem proporcionalmente com o número de tópicos inseridos numa transmissão. Os problemas surgem também com factores relacionados com a carga de trabalho dos pilotos no cockpit e da fraca proficiência em Inglês (alguns controladores falam rápido demais, o que muitas vezes é visto como o maior problema). No entanto, e de uma forma se calhar surpreendente, o ritmo do discurso não é o maior culpado pela falha nas comunicações. Nem, por si só, a deficiente capacidade com o Inglês.

Usando o “Paradigma de Navegação Barshi”, num laboratório de análise das comunicações controlador-piloto, foi descoberto que, mensagens demasiado extensas eram a causa principal pelos problemas nas comunicações.

Enquanto uma série rápida de instruções, o stress, a carga de trabalho e sotaques pouco familiares causam problemas, as soluções identificadas na análise dos dados são claras: os mal-entendidos nas comunicações ATC são reduzidos se as mensagens dos controladores estiverem limitadas a 3 pedaços de informação. Mais do que isso e os erros de “read back” e a necessidade de repetição das comunicações aumentam rapidamente.

Os autores recomendam ainda que, quando o piloto não é nativo do idioma Inglês ou aparenta estar sobre uma carga de trabalho intensa, os controladores devem limitar as suas transmissões a dois pedaços de informação. E mesmo que isso leve a uma extensão do tempo nas comunicações, quando o piloto lida com uma situação anormal ou de emergência, é sugerido que apenas se deve transmitir uma instrução de cada vez.

Até que a comunicação controlador-piloto por data-link seja usada de forma mais global e os controladores consigam de forma rotineira transmitir informação para os computadores das aeronaves, o Controlo de Tráfego Aéreo dependerá das comunicações por voz. Na base das descobertas descritas na publicação referida acima, os controladores devem ser treinados para resistir à tentação de passar toda a informação de uma vez só, numa transmissão longa. Ainda que isso possa ser satisfatório a nível pessoal, é uma forma pouco inteligente de transmissão de informação. Os autores confirmam que tanto os erros de “read-back” como de “hear-back ” ocorrem quando os pilotos não são capazes de compreender, lembrar e processar totalmente a informação que recebem.

Tendo em mente a origem norte-americana do livro, verifica-se que a origem da fraca comunicação está tanto nos controladores como nos pilotos, tal como nos nativos e não nativos do idioma Inglês. Recomenda-se que aqueles que apresentam menos dificuldades na expressão inglesa devem assumir a responsabilidade pelo sucesso das comunicações, mas aparentemente este facto não é discutido de forma competente no treino, tanto de controladores como de pilotos. De igual forma, não se treinam as estratégias de resolução de problemas deste género.

Com uma breve pesquisa no Youtube, conseguimos testemunhar a situação de um controlador do Aeroporto de Nova Iorque (JFK), que frustrado com a incapacidade de comunicar com uma tripulação chinesa de forma a conseguir manter uma movimentação de tráfego eficiente, se vê obrigado a instruir a imobilização da aeronave e praticamente a soletrar a informação que pretende passar.

De forma pouco surpreendente, até aqueles que não têm dificuldades com a língua inglesa se deparam com problemas em transmissões excessivamente longas. Um piloto britânico, a preparar a descolagem de um aeroporto, reporta estar “apertado” para assimilar 7 informações diferentes relativas à SID que terá de executar, transmitidas por um controlador com sotaque local cerrado:

  • Nome da SID;
  • Subida;
  • Vectores;
  • Altitude inicial;
  • Altitude final;
  • Código transponder;
  • Frequência de contacto.

Ao ver-se obrigado a pedir que o controlador repita a informação, desculpa-se na frequência dizendo que o controlador “fala tão rápido e com um sotaque tão estranho”, que simplesmente não consegue copiar toda a informação.

Até que a comunicação data-link seja utilizada globalmente, talvez se deva tentar melhorar a transferência de informação entre controladores e pilotos com os seguintes pontos:

  • Limitar as transmissões a 3 pedaços de informação em situações normais, ou menos em situações anormais;
  • Arranjar estratégias para que os indivíduos nativos do idioma inglês assumam a responsabilidade pela transmissão da informação com sucesso.

Tradução e adaptação João Queirós. Abril16. Republicado Abril de 2020. Artigo original HINDSIGHT MAGAZINE by EuroControl autorização para o cavok.pt. As fotografias deste artigo são meramente ilustrativas.

Nota: Este artigo contem links embebidos em palavras ou frases a bold, que reencaminham para outros sítios da web de interesse para o assunto do artigo.