Gestão dos Fluxos de Tráfego Aéreo – EUROCONTROL

Sabia que, na maioria das vezes, quando ouve o Comandante do avião dizer que o seu voo está atrasado por restrições de tráfego aéreo, as razões são externas à capacidade do controlo de tráfego aéreo, e que este atraso é determinado e gerido por uma entidade sediada em Bruxelas?

Quando o aeroporto de destino, à saída dos Açores, é um aeroporto Europeu, o contexto regulatório associado à operação nesse aeroporto é, desde logo, definido por um pacote legislativo publicado no âmbito do projecto criado pela Comissão Europeia, em 2004, denominado Céu Único Europeu, usualmente conhecido por Single European Sky (SES).

Apesar dos aeroportos dos Açores, como já vimos, se encontrarem na região NAT (North Atlantic) da ICAO, que, por decisão estratégica de Portugal, não integra o referido Céu Único Europeu, o facto do aeroporto de destino ser Europeu tem desde logo impacto na gestão do voo em questão.

O referido pacote legislativo associado ao Céu Único Europeu foi criado com o objectivo de reformar a gestão do tráfego aéreo na Europa, dando-lhe o necessário enfoque em questões relevantes, como as de suportar um aumento considerável de tráfego aéreo previsto para o futuro, mantendo no entanto os níveis de segurança adequados, e as de melhorar os rácios de eficiência dos voos em termos de custo e de impacto no ambiente.

Vejam-se no entanto as dificuldades que enfrentam actualmente os países Europeus, com destaque para os do centro da Europa, resultante da falta de acompanhamento do crescimento da procura com o da capacidade nas infra-estruturas aeroportuárias e nas de controlo de tráfego aéreo, resultante de uma legislação limitativa no contexto de crescimento actual.

No processo de operacionalização do Céu Único Europeu a Comissão Europeia nomeou, em Julho de 2011, o EUROCONTROL, organização inter-governamental com seu início em 1960 e que actualmente conta com 41 membros, para o exercício das funções de Network Manager, ou sejam, as de gestor da rede de tráfego aéreo na Europa usualmente denominado por ATFCM – Air Traffic Control and Capacity Management, que na prática corresponde a fazer a gestão de todos os fluxos de tráfego aéreo, implementando um planeamento eficaz de todos os voos antes mesmo deles descolarem (fase estratégica e pré-táctica) e optimizando diariamente os referidos fluxos (fase táctica).

Esta gestão de fluxos é efectuada tendo em conta, não somente eventuais restrições no controlo de tráfego aéreo (e.g. insuficiência de sectores disponíveis face ao volume da procura), mas também, e não menos importante, as condições meteorológicas previstas (e.g. LVO, Low Visibility Operation), as limitações de espaço aéreo (e.g. exercícios militares), a capacidade aeroportuária (nº de movimentos por hora, que resulta das características intrínsecas operacionais da pista e dos terminais do aeroporto), as inoperacionalidades de algum equipamento de navegação, de comunicações ou de vigilância, devidamente publicada através de NOTAM em AIP (NOTAM – Notice To Airmen), ou mesmo o aparecimento de um DRONE nas proximidades de uma pista.

Na execução desta tarefa o Network Manager tem que receber informação fidedigna e actualizada de todos os stakeholders onde se incluem os prestadores de serviços de controlo de tráfego aéreo (NAV Portugal), os aeroportos (ANA Aeroportos e Handlers), as entidades que prestam os serviços de meteorologia (IPMA) e os militares (FAP). Para o efeito está em desenvolvimento, e já em fase de implementação no Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, um projecto que integra de forma eficaz todo este processo de partilha de informação entre stakeholders, denominado CDM (Collaborative Decision Making).

É, assim, neste enquadramento organizativo e funcional que percebemos que quando estamos sentados num avião logo pela manhã, onde não há atrasos acumulados do dia e já com a porta fechada, pronto para descolar, e que temos a informação do Comandante que por motivos de restrições de tráfego aéreo (ATC), temos que esperar por exemplo 20 minutos, ou mais, este atraso não tem directa e exclusivamente a ver com a disponibilidade ou eficácia dos serviços de Controlo de Tráfego Aéreo, mas sim resulta de uma decisão do EUROCONTROL que teve em consideração a interacção de um conjunto de variáveis como a capacidade da infraestrutura aeroportuária (normalmente a de destino), as condições meteorológicas, a actividade militar de utilização do espaço aéreo, alguma restrição operacional temporária, e também a capacidade do controlo de tráfego aéreo.

Francisco Gil. Gestor Aviação. 20 de Dezembro de 2018. Publicado em “Açoriano Oriental”. 

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