O enorme reconhecimento de um “largado”

Nota muito importante – a transcrição de alguns diálogos pode ferir a susceptibilidade de alguns leitores, tal a linguagem rude utilizada. Manda a verdade, todavia, que a mesma seja transcrita na íntegra, não vão os autores demandar-me judicialmente por haver modificado o que disseram…”

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Meus caros companheiros, colegas (que não as meretrizes), camaradas (em estrito sentido castrense) mas, sobretudo, amigos…
Descrever-vos a sensação de enorme júbilo e alegria que ontem tive, é completamente impossível !
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Nem os mais vernáculos escritores ou aqueles políticos da nossa praça, que usam e abusam da “adjectivação a metro”, conseguiriam passar a escrito, o que para mim significou o dia de ontem.
Sobretudo, porque, reconheço, o vôo do Sábado anterior, com o Zé Lino, tinha sido um absoluto e rematado… desastre ! Sei que as condições meteorológicas eram menos boas, que o Instrutor estava com uma ilimitada paciência, mas sei também que a distância a que eu estava de um deficiente motor era curtíssima !!! Das 5 supostas aterragens, consegui o milagre – qual Santa Isabel que transformava o pão em rosas… – de fazer 5… atracagens !!!
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A tal ponto foi o “desastre” que fui eu, por minha iniciativa e sem tal perguntar ao Senhor Instrutor (acho que foi a minha primeira genuína e verdadeira decisão como “Comandante” da aeronave), de dizer na fonia “Cascais Tower, Charlie Lima Mike on left downwind runway three five for full stop landing“. Depois de sair do avião, só não entreguei o Cartão de Aluno, porque… já custou uma “patada de massa” !!!

Devo dizer-vos que o resto do fim-de-semana foi pautado por tenebrosos pensamentos relativos à tomada de consciência da minha inaptidão aeronáutica !!!

Daí a expectativa de ter encarado o vôo de ontem – embora com excelentérrimas condições para a “prática da modalidade” – com (talvez) maior concentração e responsabilidade. Isto é: de uma vez por todas, tinha que tirar as eventuais dúvidas que tivesse sobre a minha própria proficiência !
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O Fernando, posso dizê-lo, até não estava demasiadamente paciente (pudera (!), já tinha 4 horas de 2 distintos exames, no bucho), e foi relativamente “seco” no discurso de “briefing” externo e depois interno, na aeronave.

Check list“, motor em marcha, rolagem, pedido de instruções ao instrutor, resposta do tipo “dry clean“:”traffic pattern“, procedimentos fonéticos, alinhamento à pista 17 e.. descolagem ! Tudo parecia razoavelmente bem, primeira aproximação, concentração, a aterragem saiu bastante boa, sem comentários relevantes; segundo circuito, concentração em tudo e mais alguma coisa (velocidade, configuração de aterragem, “flaps“), segunda aproximação e… parecia que levava uma grávida a bordo. Modéstia à parte, apaixonei-me por mim próprio, tal foi o brilhantismo do desempenho. Mas foi só por segundos, porque… acto imediato e na corrida para a terceira descolagem, o gajo começa aos berros dentro do “cockpit“: “Estás phodido ! Estás phodido ! O avião agora é meu, karalho !”. Nas imediatas fracções de segundo, pensei. “Porra, mas o que é que eu (agora !) fiz??? Só que o gajo diz para a torre: “Charlie Lima Mike on right downwind runway one seven for stop and go, if possible“. Estava consumado o acto !

Daí para a frente, foi… imemorial ! Lá deixei o homem na “holding position” da 17, reiniciei procedimentos, e com cerca de 15,000 contos na mão, meti motor a fundo ! Parecia um míssil a descolar, para fazer o meu primeiro circuito “limpinho”. E fi-lo !!!

E foi por o ter feito que, ao mesmo tempo que na fonia ouvia o nosso Caribbean Accidental Tourist (“Nini”) a dizer “Joããããooo, are you alone ???”, me perpassavam na mente as muitas pessoas a quem eu devia esta conquista e o culminar de um sonho com mais de 30 anos !!!

Não querendo ser “poeta popular” ou “novelista de cordel”, tive por momentos a sensação que ali dentro, apertadinhas comigo estavam o então Major José Infante (meu Padrinho-do-Ar, infelizmente já desaparecido, que no Auster D5 de matrícula CS-ANA, da saudosa, mas extinta, Mocidade Portuguesa, me “baptizou”, num vôo de 18 minutos em Alverca, em 18 de Agosto de 1968), o meu Pai, que muito me ensinou sob o ponto de vista teórico, a Nita, a Romana e o Joca, que em casa me “moeram” a cabeça para eu deixar de ser forreta e ir fazer, finalmente, uma coisa que me desse gozo e me resolvesse uma enorme frustração, e todos os destinatários desta mensagem-“desabafo”, sem uma única excepção!!

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Lá fiz depois, mais uma vez, o circuito. Procedimentos seguidos à risca, para fazer a primeira aterragem. Sim !!! A primeira aterragem, sem ter ninguém a dizer “Aponta a carabina !!! Aponta a carabina !!!”, ou “Pés !!! Pés, porra !!!”, ou ” Cruza !!! Cruza !!!”, ou ainda “Deixa planar !!! Deixa planar, phoda-se !!!”. E fi-la !!! E quero-vos dizer que, logo após, ouvi na fonia o mesmo Caribbean Accidental Tourist (“Nini”) (sei lá onde é que o gajo estaria…), a dizer, só e apenas, com uma reconfortante tranquilidade “Impecável !”. Sem ser lamechas, saltou-me, confesso, uma lagrimita. Senti que tinha conseguido e, como atrás dizia, que uma enorme parafernália de gente para isso tinha contribuído. A minha própria contribuição, tinha sido aprender o melhor que podia e sabia, o que outros me tinham ensinado ou incentivado e… pagar a conta (obviamente !!!…) !!!

A chegada final, foi o que foi, e muitos lá estiveram a testemunhar, a fotografar, a banhar, a “calduçar” e a pontapear. Ironicamente, estavam três salas cheias de alunos e doutos instrutores, que interromperam os seus trabalhos para recepcionar e felicitar este Servo de Deus Frustrado Aviador, mas que ontem se fez um homem muito feliz !!!
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E daí vos estar a endereçar esta nota. Os destinatários, estão divididos em dois grupos e, dentro deles, por ordem alfabética. Ao primeiro grupo, o dos Senhores Instrutores de Vôo, eu quero agradecer tudo o que tecnicamente me deram, com todo o vosso saber, a vossa experiência e, sobretudo, a vossa paciência ! As características de cada um dos quatro, jamais as esquecerei, e de todos tirei “a cana que me deram para pescar” (esta da cana não foi muito boa, porque dá azo a outras interpretações; só que o sacana do ditado chinês, fala mesmo da cana para pescar !!!). Ao segundo grupo, o dos Ultras, reconhecer a vossa enorme “estratégia de acompanhamento”, de incentivo, de discussão, de troca de informação, de amizade, de cumplicidade, de conluio, enfim, características que nos tornaram e tornarão, um grupo que – desculpem os senhores da Pelicano – certa e indelevelmente marcaram a ainda curta história da Escola.

Aos copiados, uma palavra de igual reconhecimento, nas múltiplas qualidades que lhes atribuo. Ou sejam, nas funções que ocupam na Escola (Direcção de Escola, Direcção de Instrução e “Mestre-Geral” das Teóricas), mas também pelo que ontem “especialmente” contribuíram para a celebração festiva.
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A todos, portanto, o meu muito obrigado e o meu reconhecimento !!! Nunca conseguirão imaginar, o quão contribuíram para esta minha satisfação !!!

Ultra Abraços !!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Juliet Tango (agora já autorizado a conviver com e nos mesmos espaços de Pilotos Licenciados !!!)

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João Manuel Taveira. Fotos meramente ilustrativas do artigo por Paulo Antunes.