“I have an appointment! I really have to go …”

Precisava mesmo de ir a Braga.” Tinha amigos à minha espera.
Podia ter ido de carro. Mas que diabo, até tenho avião disponível, licença e a meteorologia vai ficar má ao início da noite, mas dá-me espaço para entrar em Braga. A viagem é bonita. A lendária exploração do estado que devia ser de nós todos, só parcialmente chegou ao céu dado que ainda não tem portagens. Até ficava mais barato. Afinal não é só para gozar o voo… é um eficaz meio de transporte.

Rota: Benavente, Barragem de Crestuma, Vilar de Luz, Braga.
Tempo estimado: 1h40 LPPR
TAF: 250/8 9999 FEW017 BKN035 BECMG 17/19 5000BR SCT004 BKN008 TEMPO 19/02 2000 DZRA BR SCT001 BKN003
O resto é ainda pior mas já era à noite. E eu chegava às 1830, portanto tudo azul. E para mais, depósitos cheios, 4 horas de autonomia.
Plano de voo metido porque voando sozinho, busca e salvamento dá sempre jeito.
Nível 50, VFR.

Chegado ao pé de Aveiro…
Nuvens! Espaçadas. Via-se bem para baixo, mas como não sou da zona e com receio que se pudessem juntar mais, não dominando eu bem o terreno e consultando na carta que as altitudes de segurança que não são assim tão baixas, pedi para me juntar à linha de costa.
Pensei eu, em descer sempre na linha de costa, chegar a Esposende e Cávado acima “riodrómica” até Braga, ainda que esperando alguma Neblina.

A atmosfera estava estável e a bruma começou a fazer-se sentir. VFR total, longe de nuvens mas com o horizonte a ficar esfumado com o mar. “not very good”, pensei.
Porto, request descend 3000 feet shore line.
Aprovado.
E pedi a visibilidade no Porto.
Está a ficar mais fechado…“desanimador.

Passei Espinho que estava óptimo achei que continuando podia voltar para trás. E podia. Mas que diabo, Braga está à minha espera!!
“E se eu descesse já tudo de uma vez?”
É menos uma para me preocupar e só tenho que gerir navegação e avião. Bem dito, bem feito.
Porto, request 500 ft shore line.
Aprovado reporte a Barra do Douro.
Seguido de “reporte Refinaria”, “Vila do conde” e “Esposende”.

Comecei realmente a sentir a praia perto. As pessoas olhavam para cima. O que faria um aviaozito tão baixinho. Mau presságio porque nesse dia já tinha havido um acidente com um colega Espanhol por baixa visibilidade, mas bastante mais para Norte.

Posso sempre voltar para trás. E se… na Barra do Douro a praia é má para qualquer aterragem de emergência, mais para Norte fica um pouco melhor. 300ft. A bruma roçava a canopy.
Bem é momentâneo. “Já passa!!”


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Não passou. Piorou.
E resultou eu ter vindo sempre a mentalizar-me de quais seriam os meus limites. Qualquer chaminé de barco já estaria muito perto.“Paramos por aqui.”

Request 360 by the left.” Para ver como estão as coisas atrás.
Aproved.
Ao chegar aos 180 graus… horror, o tempo tinha abertas claras para cima mas estava todo ele a fechar como um manto branco. Em breve, nem para a frente nem para trás.

Não é tempo de hesitar. O truque de fazer o cruzeiro alto… resultou, sabia exactamente onde estariam os tops mais altos. Encontrei uma aberta porque se a bruma era rente à canopy, um pouco mais acima a camada era estratificada e não muito densa. Apenas se apresentava mais densa na costa. Mais, aliás do que estimava.

Apanhei uma aberta, nesga de céu azul tão bem vindo e ele aí vai…
Request climb imediatly 5000ft.
Tem licença de instrumentos?
Eu tenho, o avião é que não, mas estou visual.”…e estava. Com o céu, com a terra, menos com o que me rodeava. Subi.

CAVOK_LM_Nome do arquivo-48[spacer height=”20px”]

Mesmo com vislumbres visuais constantes durante a subida a rotação de 180 graus e subida a full power mantiveram o meu Gyro interno a rodar.

Agarrei-me ao Gyro do avião – Vieram os velhos mestres ter comigo, bem vindos!! Acredita sempre nos instrumentos se nada antes te fez desconfiar. Um pouco de pé para contrariar o Torque e P factor, rumo religiosamente alinhado no Gyro, olho no céu azul em cima, não olhar para baixo. Uma piscadela na velocidade. Já por cima acabou a bruma. Só nuvens aqui e acolá, mais aqui que acolá.

Eram mais claras as abertas para terra… acolá.

Momento de poesia ao nivelar. Um pouco de água a escorrer do aileron esquerdo. Pura magia. Tudo tão calmo. Tão aterradoramente calmo. Estável. Autocontrole. Sempre. “Calma companheiro.

Air: algumas nuvens, bruma estratos.
Man: bem, até agora tudo bem, mas tenso definitivamente, a julgar pela força que reparei usar no manche.
Ship: temperaturas e pressões Ok, temperatura do carburador longe de níveis de gelo. Boa autonomia. Mas cheira um bocado a gasolina… um pouco mais que o habitual. Não há-de ser nada!!
E agora?
Autonomia: restam 2h20. “Menos mau.”

Porto pode ligar lá para Braga e Vilar de luz, e perguntar como é que estão?
Estou a tentar.
Mais cinco minutos. Espera interminável.
Olhe, acabaram de depositar um plano de voo em Braga para lançar páraquedistas. Não deve estar muito mau.

Por esta altura o que eu via de terra era perfeitamente suficiente para manter o controle seguro do avião, mas insuficiente para uma adequada navegação terreno se não tivesse GPS.

Pretendia directo a Braga, por favor.” Alternativo Vilar de Luz já que ouvia na frequência aviões a descolar de lá.

Entrei. Via o terreno. Vi o Cávado. Também vi que em caso de falha de motor, os buracos por onde entraria me deixariam uma margem diminuta para escolha de um terreno adequado.

Tempo do Norte, que fecha de repente e não respeita TAF’s!!
Vi Braga. Exultei!!
Agradeci ao Porto e aos outros aviadores toda a ajuda.

Aterrei. Bumpy!!!! Tinha-se ido a finesse!

Chão, motor desligado e a recordação dum cheiro mais intenso a gasolina na final. “Que se lixe estou no chão.”

“Obrigado meu Deus!”
Mas 1h40 de voo transformou-se em 2h10.
Faz pensar quando for a hora de andar curto de gasolina.
Finalmente no chão e no estacionamento que o sempre impecável Francisco Andrade, Presidente do Aeroclube de Braga me arranjou.
Alô Tó, cheguei, mas…nem queiras saber. Calcula tu que…“ mais uma boa história, felizmente.


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Dois dias depois…. Voltar para Lisboa.

Inspecção pré voo.
Lembrei me dum aviador que um dia ao fazer inspecção comigo me lembrou que a bomba eléctrica se devia por em carga para ver possíveis fugas. “Obrigado Diogo!!!” Assim fiz. Até é pouco aeronáutica, tem um aspecto frágil. De plástico. Jorrou gasolina por um Oring malandro. Explicado o cheiro!! “Mesmo por cima do escape!”
“…E eu e os sócios que nem poupamos custos na hora da revisão de program…”
Alô Rui, como é?
Só de bypass ou é no go.
Mais uma hora de atraso, a maravilhosa e pronta colaboração do Sr. Cícero do Aeródromo de Braga e das mãos experts de tantos anos do Sr. Robalo com tanta Força Aérea, África, aviões e helicópteros.

Obrigado companheiros.

Bypass! Fica pendurado na bomba mecânica. A eléctrica já era.

Telefone quando chegar.
Assim farei!

Decidi ir. Afinal a bomba eléctrica até é um extra.
Problema resolvido ou pelo menos adiado com segurança.
Tubo de cobre a unir, abraçadeiras e freios. Parecia de origem, “Grande Sr. Robalo.”
Alô Luis, estou a ir para baixo a rota é…“ tal “já sabes onde me procurar se eu não chegar” e mais uns reportes via SMS do que ia passando com tudo vai bem a bordo. “Ainda passo no Alqueidão para te cumprimentar.

Mas quando penso, só um bocadinho como poderia ter sido se o Sr. Murphy estivesse mais atento naquela tarde…

Não recomendo! Confesso!!

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In Revista APAU VOAR . Autor João Dantas 
Dezembro 2015. Fotografias Luis Malheiro, Dominik Schroder e Iker Urteaga