Porque existem barreiras aos visitantes nos airshows e eventos? Barreiras costumam ser para adeptos futebolístas arruaceiros. Ou para o gado.
Como posso eu mostrar os aviões ao meu filho a dez metros de distância ou explicar-lhe que as outras pessoas lá ao pé do avião podem lá estar porque são “conhecidos”?
Lembro-me de há uns anos ir a Tires, tentar mostrar uns aviões ao meu filho. Tudo o que consegui ver, foram Cessnas a mais de vinte metros, por detrás de uma rede. Ao perto ao perto, consegui ver um segurança com botas e um transmissor, a dizer-me que não podia entrar, que tentasse mais tarde, porque “o engenheiro” não estava lá.
Já lhe tinha mostrado o excelente Museu do Ar e assim, de repente em Lisboa, só podíamos ir ao aeroporto ver os aviões aterrar. E que sorte nós tínhamos! Porque fora de Lisboa, os outros meninos só podiam ver aviões nos escassos aeródromos e campos de voo.
Em airshows nem pensar, pois sempre foram raros e concentrados nas grandes cidades.
É neste panorama que um entusiasta tem de viver em Portugal: Poucos aviões, poucos eventos, poucos locais para ver aviões. E nos poucos eventos que tem, a sorte de poder assistir, lá estão elas… redes, vedações, barreiras , fitinhas e os tais seguranças com transmissores. Só falta um jipe da GNR. Talvez porque ainda não se lembraram.
A experiência do visitante desde que paga o bilhete até que regressa ao carro, é de que lhe foi dada uma ocasião muito excepcional e privilegiada de estar próximo de aviões. Mas não “muito próximo”, não penses…! Uma proximidade tipo “ir ver os leões ao circo” cercados por grades para a nossa protecção… (dizem as más línguas que as grades e as vedações servem para garantir uma proximidade tipo “não mexas que isto não é para o teu dente!” mas nem vamos pensar numa coisa dessas, não é verdade?… )
“ Mas é um perigo, os aviões têm de estar separados das pessoas..”
A única ocasião em que isto se exige, é naturalmente entre o airside onde os aviões circulam e são postos em funcionamento e o público. Mesmo em aeródromos e eventos onde isto não é fisicamente possível. Por exemplo, quando não existe apron ou placa, a organização do evento permite durante algum tempo o acesso dos visitantes em slots de pouco ou nenhum tráfego.
“Ah, mas sabes, as pessoas mexem em tudo e partem tudo, enchem tudo de dedadas…”.
Pois enchem. Pois partem. Ainda há uns meses meti um pé dentro de uma asa de um Tiger Moth. Mas como sou eu que o estou a arranjar, menos mal…
Mas para que serve uma “organização” e os proprietários de aviões num airshow? Para cobrarem bilhetes? Para irem para o bar e estarem sentados todos peneirentos a ver as pessoas a tirar fotos ao seu avião?…
Pensei que tanto uns como outros estivessem lá por causa do entusiasmo que têm pela Aviação, e quisessem usar o privilégio que têm, para transmitir aos outros o entusiasmo pela Aviação. Mas se calhar estou enganado!
Eu sou voluntário na preservação de aeronaves. Nos meses de Inverno, quando não posso voar, podem-me encontrar nas oficinas, aprendendo e reparando desde Tiger Moths a bombardeiros nucleares Handley Page. Nos meses de Verão, trabalho voluntariamente em organizações de airshows… Bruntingthorpe, Duxford, Cosby, etc. Daí perceber uma ou outra coisinha sobre o assunto.
Eu tinha vergonha de dizer que pertencia a uma organização de airshows e não estar lá ao pé de um ou dois aviões, ajudando as pessoas a tirar fotos e a subir dentro dos cockpits de um ou outro avião. E claro, a dizer aos pais dos putos para não os deixarem meter ranho na fuselagem.
De resto podem tirar fotos, perguntar coisas, tocar e experimentarem entrar lá dentro, se isso for possível. E depois pego num paninho e num spray e limpo o ranho que o puto deixou na fuselagem. Ou a pegada que ele deixou na asa!!
Sabem porquê? Porque assim transmito o meu entusiasmo e é uma forma de agradecer o privilégio e a sorte de estar a trabalhar com o que gosto, com aviões. Porque em cada dez pessoas a quem ajudo na sua experiência de terem vindo a um airshow, dez dizem-me “Uau, obrigado pela sua ajuda, gostei muito.”
Quando um senhor de meia-idade me diz que “Nunca tinha estado dentro de um caça militar, não sei o que dizer, nunca esperei…”, para mim já ganhei o dia.
É isto que significa pertencer à “organização” de um encontro. Ser uma “organização” não é colocar correntes, porque estar ali a aturar as pessoas é um frete. As organizações têm de transmitir o seu entusiasmo e fomentar o convívio e proximidade com aeronaves.
Para o ano as pessoas voltam e trazem mais amigos e família. Só assim se constrói um panorama e um circuito de eventos cada vez maior e melhor.
Mike Silva. Setembro 2015. Fotografia Mike Silva e Pexels
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