Pilotos UL, profissão e comunidade

Há muitos séculos que o homem tem o desejo e o sonho de voar, começou por observar os pássaros e a partir dai adaptar o seu corpo a penas e armações, que infelizmente o levou a muitos acidentes e vítimas a lamentar.

Esses episódios não o demoveram, continuando a construir maquinas e “gingarelhos“ que o levaram ao resultado de muitos prejuízos e perdas de vidas.
No inicio do Séc. XX os irmãos Wright (1903), fizeram o 1º voo em avião com sucesso, e a partir daí deu-se uma autentica revolução no mundo da aviação.
A historia demonstra que desde 1903 até aos dias hoje a aviação teve um crescimento tal, que passou a ser uma actividade vital para o bom funcionamento do mundo em praticamente todas as áreas.

No que diz respeito a aviação de lazer, também o salto foi abismal, permitindo que qualquer pessoa possa pilotar um avião e ser seu proprietário como acontece com o automóvel, uma vez que os custos para a aquisição e manutenção são acessíveis a um grande numero de pessoas. É nesta realidade que se enquadra a aviação Ultraleve.

Quicksilver

E sobre os tempos de hoje que vos quero falar. Sobre os diversos tipos de Pilotos e de motivações que levam alguém a tirar uma licença de Piloto de ultraleve.

Qualquer pessoa com mais de 18 anos pode candidatar-se, basta para isso inscrever-se numa estrutura formativa e concluir um curso de formação com aproveitamento, findo o qual, lhe será atribuído uma licença de Piloto de Ultraleves na classe para a qual se inscreveu.

As motivações que levam o comum dos mortais a tirar o “brevet” são as mais variadas, desde a concretização de um sonho, à busca de liberdade, de aventura, ou ainda o caso mais frequente, a utilização da modalidade como hobby, com tudo isso junto.

Existem enormes restrições a utilização de aviões ultraleves para trabalho comercial, como por exemplo: fotografia, reboque de planadores ou táxi aéreo, deixando apenas espaço a sua utilização como actividade de lazer.

Não sendo claras as razões, arrisco que seja por ser uma aviação de manutenção não certificada que assenta num modelo auto-declarativo, isto é, cada proprietário e responsável por tudo o que a aeronave diga respeito, manutenção periódica e conservação.

Os fabricantes disponibilizam todo tipo de informações e suporte para a manutenção o que permite, se o proprietário o entender, ser ele a fazê-la e contratar apenas o que tecnicamente não se considera capaz de fazer com competência. Esta possibilidade trás os custos de manutenção para valores muito mais acessíveis sem comprometer a segurança. De outra forma, voar seria apenas um luxo para alguns.

A modalidade permite um amplo convívio, quer no ar, quer em terra, poder voar em paisagens fantásticas, de norte a Sul do País, como por exemplo: a nossa Costa, o nosso Alentejo, a zona do Douro, Trás-os-Montes entre tantas outras…e um privilegio dos pilotos, e seus acompanhantes.

Dominar a máquina em todas as fases do voo, planear uma viagem, apenas para ir almoçar a outro lugar, e outra satisfação pessoal que todos sentem, com maior ou menor intensidade. Ir do centro do pais ao sul e voltar no mesmo dia, e algo fantástico e indescritível…se fossemos de carro, com o tempo que demoraríamos a lá chegar simplesmente não iríamos, por isso e em boa verdade ”I´m talking about fun“.

Os Pilotos de ultraleves tem diversas actividades profissionais… São pilotos profissionais da aviação comercial ou militar, médicos, engenheiros, advogados, juízes, empresários, bombeiros, agricultores, enfermeiros, gestores, consultores, embaixadores, electricistas, mecânicos, reformados, enfim, um nunca mais acabar…

Todos terão a sua própria cultura aeronáutica.

Invariavelmente existem uns com mais do que outros, mas e exactamente aí que reside grande parte do fascínio da aviação ultraleve, pois convive-se com uma realidade que por ser tão variada profissionalmente a torna única! Na verdade todos temos Licença e estamos preparados para qualquer voo. Quer dizer, mais ou menos…

Não pode ser ignorado que os pilotos profissionais tem um conhecimento teórico bem mais aprofundado do que aquele que é dado nos cursos de PU, bem como uma experiência operacional diferente, o que lhes confere um “background” e uma massa critica bastante relevante.

No entanto a realidade dos Ultraleves assenta sobre as VFR e as VMC, o que de certa maneira nos remete apenas para a experiência da pilotagem, uma vez que não e permitido o voo dentro de nuvens nem voo com mau tempo. Em resumo, ou esta um lindo dia e voa-se, ou não esta e o avião deveria ficar dentro do hangar.

Aqui entra a atitude e o bom senso.

Aliás, a aviação ultraleve podia chamar-se aviação do bom senso, que é algo que e transversal a qualquer pessoa e, implicitamente, natural em qualquer piloto.

Com a capacidade de aprender com os erros dos outros e de aferir a sua técnica, um piloto de ultraleve, ao fim de algum tempo, fica mais consciente do que deve ou não fazer…dos seus direitos e dos seus deveres. Regras e Boas práticas são para considerar. Descolar com vento de cauda porque outro também o fez não é bravura, e apenas inconsciência que pode levar a resultados muito graves.
A margem de erro junto ao chão e praticamente inexistente e a profissão nada interessa quando se está aos comandos do avião, apenas interessa a atitude, o bom senso e não prevaricar…
Independentemente da profissão ou proveniência, o piloto deve estar ciente das suas capacidades e limitações.
Exige-se competência a todos os que voam em ultraleve. Não podemos ser displicentes, porque isso acaba em surpresas bem desagradáveis.

Também é preciso lembrar que os aviões tem um peso máximo e limites de centragem… Que há condições de densidade e temperatura que condicionam a performance, especialmente nos modelos submotorizados!

Em resumo, a comunidade ultraleve por ser tão diversa em proveniências profissionais é, em si mesma, uma riqueza e gira em volta de um gosto, ou de um hobby que é comum a todos.

Profissões à parte, pois quando voamos estamos todos na mesma linha e devemos aproveitar o momento de partilha, com humildade e espírito aberto para aprender por troca com os nossos pares. Divisões e clubismo não são sinonimo de voos mais seguros nem mais divertidos. Comunidades fechadas em si próprias estão limitadas na troca de ideias, a não ser que já saibam tudo…

Desejos de que o numero descolagens seja sempre igual ao de aterragens.

Pedro Simões in Revista Voar #13 APAU . Republicado Fevereiro 2019. Fotos Luis Malheiro, Guilhermino Pinto.