Winglets – “Aquelas asas tem um look tão cool!”

Finalmente… começou a chover!

Finalmente… parece que terminou a tão fatídica época dos incêndios! (finalmente!)

Depois de um verão tão negro, de uma seca extrema por mais de dois terços do país e de umas tentativas independentistas dos nossos vizinhos espanhóis, nada melhor do que um pouco de água para lavar todas estas tristes realidades…

Porém, enquanto o tempo cinzento contrasta com o laranja dos avisos meteorológicos e as barragens não enchem, enquanto os dias diminuem e a visibilidade não nos deixa descolar, resta-nos esperar por melhores condições para a prática da aviação de lazer.

E aviadores no chão falam de quê?

Bem… dos temas da atualidade, claro está! E além dos temas bem típicos dos Portugueses, mulheres, bola, carros, política e religião, não necessariamente por esta ordem, também se fala de aviões, de segurança de voo e de aerodinâmica.

E como o tempo está cinzento e só apetece andar o dia todo de pijama pela casa fora, resolvi espantar a “perguicite aguda crónica” de que padeço e revisitar um tema que noutro dia não consegui explicar muito bem quando quis contribuir com os meus “cinco tostões de sabedoria” numa conversa de campo de voo.

Tema: Winglets!!

Para quem tenha andado distraído são aquelas pontinhas das asas, normalmente viradas para cima, que dão aquele “look tão cool” aos aviões.

Se pensarmos apenas no design e no princípio de funcionamento conseguimos ver winglets também em pás de helicópteros e nos geradores eólicos, nas aves de grande porte e até na gastronomia ( chicken winglets  🙂 )

Mas, além do “look cool” para que é que servem?

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Um pouco de História…

Como está mais do que provado, quase tudo o que o Homem inventa tem a sua fundamentação na Natureza. O homem só conseguiu voar depois de perceber porque é que as aves voam. Antes disso todas as tentativas de imitar as aves não foram lá muito bem sucedidas.

Em 1925 um senhor chamado Ludwing Prandtl publicou um estudo onde demonstrou que a asa mais eficiente teria uma geometria elíptica (e isso levou-nos, mais tarde, ao espetacular Supermarine Spitfire).


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Depois, em 1932 publicou outro estudo onde deixa de se preocupar com a forma da asa para se preocupar com a sua rigidez e estrutura e demonstra um ganho de eficiência superior a 10%

Em 1970 um engenheiro da NASA, o sr. Richard T. Whitcomb (que é mais conhecido pelo seu contributo na ultrapassagem da barreia do som), resolveu recorrer à sua intuição em vez de andar com contas e matemáticas atrás. Pôs mãos à obra e construiu um perfil alar com cerca de sessenta centímetros. Submeteu o seu perfil alar a testes repetitivos em túnel de vento e ia alterando a sua forma até que conseguiu chegar a uma conclusão espectacular – se alterar a forma da ponta da asa para algo vertical consegue ganhos de eficiência notáveis. Trinta e poucos anos depois, a sua descoberta torna-se quase um standard.

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Aerodinâmica

Como todos sabemos, qualquer coisa que ande pelo ar está sujeita a 4 forças – peso, sustentação, impulso e arrasto. O peso é responsável por nos aproximar do chão enquanto a sustentação é a magia que o contraria. O impulso é a força que vence a resistência ao avanço (ou arrasto). Ora experimentem este simulador!!


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Já o arrasto é algo mais complexo de explicar, uma vez que soma três componentes: a viscosidade, a pressão e o arrasto induzido, todos eles impedem o avanço.

O arrasto induzido é considerado um subproduto da sustentação e, por isso, é uma das preocupações principais dos engenheiros aeronáuticos quando desenham um novo avião.

A sustentação é produzida devido a uma diferença de pressões. A pressão no intradorso é maior que a pressão no extradorso da asa e isso leva a que a resultante das forças empurre “para cima”.

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Mas tem um efeito perverso. O ar tem tendência a deslocar-se das altas pressões para as baixas pressões o que faz com que, nas pontas das asas ele enrole, como que se de um mini-tornado se tratasse.

A este efeito chamam-se vórtices das pontas das asas e não é nada bom, uma vez que cria uma força que contraria o avanço do aparelho. E ao contrariar esse avanço faz com que necessitemos de maior força de tracção (ou impulso) para o contrariar e portanto torna-o menos eficiente.

A sustentação aumenta com o angulo de ataque da asa até chegar ao angulo crítico e portanto o arrasto induzido também.

Ora, existem duas situações onde temos de voar com maior angulo de ataque. Juntinho ao solo (nas aterragens e descolagens) e em cruzeiro de altitude. A primeira por motivos óbvios, a segunda porque como o ar é mais rarefeito, precisamos de maior angulo de ataque para manter a sustentação.

Ora nestas situações os vórtices das pontas das asas atingem a sua maior expressão.

Então não seria muito bom se tivéssemos algo que reduzisse o seu impacto?

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Winglets – a solução engenhosa

Com o avanço na metodologia de construção de asas, principalmente recorrendo a materiais compósitos, é possível “dobrar” a asa na sua ponta.

Esta “dobra” funciona quase como uma segunda asa. E como qualquer asa, produz sustentação. A sustentação é sempre perpendicular ao vento relativo e a sua resultante traduz-se numa força que impulsiona o avião.

Confuso?!

Talvez seja mais fácil com um desenho:

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Até pode nem parece muito, mas este pequeno acréscimo de impulso ajuda bastante, principalmente quando colocamos o avião em ângulos de ataque elevados.

Nos comerciais permite que, em voo de cruzeiro, se possa reduzir motor, mantendo a mesma velocidade e com isto poupar algumas toneladas de combustível.


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Isto está tão “na moda” que a Airbus até tem uma assinatura própria para o seu design – chama-lhes Sharklets. E até tem uma versão para os A320. Pese embora as mais cool sejam as do 350XWB. Ora vejam este vídeo AQUI ou então visitem este SITE.

Ah! É verdade… A TAP foi a primeira companhia Europeia a fazer o retrofit num dos seus aviões. O CS-TMW “Luísa Todi”. E mais… a instalação foi “integralmente realizada nas oficinas de Manutenção & Engenharia da companhia em Lisboa”.

Confira AQUI.

Com este upgrade não só fica mais bonito, como fica mais eficiente e… ainda dura mais… Boas notícias… hein?!

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Então se isto é tão bom, porque não é universal?

Principalmente por duas razões: a técnica e a económica.

No que diz respeito à técnica nem todas as asas são passiveis de retrofit. O tipo de winglet obedece a critérios muito específicos e tem de ser cuidadosamente planeada e ensaiada. Um dos problemas associados é a tendência para fazer “flutter”.

A razão económica está associada ao que faz andar os comboios! E que faz voar os aviões! Dinheiro!

Para um engenheiro qualquer ganho de eficiência é um ganho! Para um economista esse ganho só é razoável se o que consegue obter, ultrapassar o que tem de pagar por ele!

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Conclusão?!

Para um comercial, em cruzeiro alto quanto baste, a voar durante algumas horas à razão de toneladas de combustível por hora uma ganho de 5% traduz-se num “chorudo” bónus para o “artista” que resolver colocar winglets em toda a sua frota.

Numa aeronave ultraleve de terceira geração equipado com asas tradicionais, com autonomia de quatro a seis horas a gastar gasolina a 18 litros hora (alguns menos ainda) …. Se calhar deixamos isso de trocar as asas para segundas núpcias…

… Mas lá que são lindas… isso são!


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Para quem não quiser ter a paciência de ler o artigo até ao fim pode sempre ver este vídeo AQUI.

E fica tudo explicado.

Fim 🙂
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Carlos Miguel Costa. 24 de Novembro de 2017. Ilustrações por António Palma. Fotografia por Nils Nedel, Gabriele Ibba e Luís Malheiro.

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