Lições e “Trambolhões” Take One

Artigo de Opinião

 

Nota: Só agora fui autorizado pelo Cavok.pt a publicar estes artigos..

[spacer height=”20px”]

Após ter concluído o curso de Asa Delta, efectuado no Aeroclube de Portugal no princípio dos anos 80 do séc. passado, comecei a tratar do processo de adquirir uma Asa Delta. Nessa época haviam muito poucos aparelhos deste tipo em Portugal e a sua encomenda era efectuada ao estrangeiro e era um processo lento e caro.

Falei com o meu instrutor, o José Manuel e ele procurou encontrar uma Asa Delta em Portugal. Depois de algum tempo apresentou-me uma solução de adquirir um aparelho bom para iniciados a um colega que estava a querer fazer um upgrade para uma de competição.

Lá comprei a Asa, com o arnês, capacete e um paraquedas manual de ventre e um suporte para poder transportar no carro.

Aprendi a montar e desmontar o equipamento, as técnicas de nos enfiarmos no arnês, estando pronto e ansiando para o meu primeiro võo, na minha nova Asa Delta.

Então num fim de semana, em que estava bom tempo, combinei com o José Manuel e com o meu amigo João Pedro Neto Rocha, irmos a um local para eu poder fazer o meu primeiro võo.

Lá arranjámos uma encosta bastante pronunciada, com uma zona que permitia fazer a descolagem, levámos a bucha para almoçar e lá fomos.

Chegámos ao local e era lindo, com um desnível cerca de 200 metros e campos de cultivo a perder de vista.

Mas, há sempre um but, havia um problema, as condições eram excelentes, exceptuando não haver vento nenhum.. (nas asas deltas é preciso descolar contra o vento)

Bem, lá esperámos, esperámos, até que lá pelas 19 horas, começou a soprar uma nesga de aragem. Aí eu já estava a ficar farto de esperar e disse vou mas é já tentar descolar e experimentar a máquina !

O José Manuel homem experiente nestas lides: ó David, o melhor talvez fosse arrumarmos as coisas, tentar amanhã que é Domingo e talvez a meteorologia esteja melhor, não vale a pena arriscar.

Eu que já estava no limiar da paciência e o dia estava a acabar, não ia desistir do meu sonho de experimentar já o meu novo aparelho voador.

Assim contra a opinião dos presentes, disse-lhes, vou mas é já para o ar, antes que seja noite. Como há pouco vento, vocês ajudam-me e dão um empurrão final para eu descolar…

Dito e feito, lá me equipei o melhor que sabia, com os nervos à flor da pele, luvas, botas, arnês ligado à asa, e preparei-me para descolar com a ajuda dos meus amigos.

Depois de breve concentração, lá comecei a correr desenfreadamente, com os meus amigos a ajudar, até à borda do precipício.

Quando entrei no vazio, evidente, não tinha velocidade suficiente, pelo que tive um afundamento brutal e quando olho, tinha um sobreiro à minha frente que com um milagroso empurrão no triângulo e encolhendo ao máximo as pernas, lá consegui ultrapassar.

Portanto estava no ar, tratei de me encaixar bem no arnês, colocar a máquina no seu melhor índice de planeio, tudo bem e a funcionar vamos começar a pensar onde será a zona de aterrar..

Esta asa, comparada com as asas de instrução, era uma máquina muito mais potente, com maiores velocidades, maior índice de planeio e muito mais sensível aos comandos.

Lá fui voando, até que já estava sobre a planície e observei o que pareciam campos de cultivo, todos iguais divididos por pequenas linhas de água e vedados por cercas.

Comecei a tentar perceber onde é que o índice de planeio me ia levar e decidi aterrar num determinados campo, que me parecia alcançável e um pouco maior que os demais.

Preparei-me para aterrar, coloquei-me em pé, e comecei a tentar aterrar no dito campo. Bem aqui a coisa começou a falhar, a asa voava voava que nunca mais acabava.. era o chamado flare infinito..

O pôr do sol já vinha a caminho e de repente na minha aterragem, descortino no meu horizonte próximo o fim do campo, delimitado evidentemente por uma cerca de arame farpado para aí com metro e meio de altura.

Bem aqui, como se diz, comecei a ver a vida a andar para trás e logo em seguida o campo acabou, a asa ainda voava e claro, consegui passar pela cerca tudo, menos os meus pés que ficaram presos no arame farpado. (porque raio tinham cercas de arame farpado em campos de cultivo?)

David Ferreira Pendular

Como é fácil de perceber nesta posição a 40 ou 50 km por hora e preso pelos pés, tive um grandessíssimo trambolhão em que eu e a asa rodámos 90% directos à dita linha de água.

Não parti nada, mas o estado resultante, foi muito desagradável, foi devido a que não era um campo de cultivo era um campo de pasto de gado e os tais regos de água, não era água era estrume !!

Resultado verão, noite a chegar, mergulhado num monte de estrume, o cheiro era insuportável e a ser simultaneamente picado por n + 1 insectos de todos os tipos e feitios.

Para somar à desgraça fez-se noite e os meus amigos demoraram mais de uma hora e meia a chegar ao local do trambolhão..

Esta foi a minha primeira experiência, na actualmente chamada aviação ultraligeira.[spacer height=”20px”]

Lições a tirar:

Nunca voar sem estarem as condições mínimas meteorológicas para o efeito

Nunca voar sem verificar as condições de descolagem no fim da pista

Nunca voar em estado de grande ansiedade ou nervosismo

[spacer height=”20px”]

David Ferreira

 

24 de Outubro de 2015

[spacer height=”20px”]

 (Nota do CAVOK.pt : Por falta de fotografias da época mencionada por parte do autor em asa delta, optámos por colocar fotos do mesmo autor mas em aeronave pendular motorizado)